domingo, 18 de agosto de 2013

Os Simpsons e a minha Tese

Passou na Fox um episódio da 20ª temporada de Os Simpsons. Nesse episódio os personagens tentam contornar o problema do cadastro escolar de Springfield. Homer e Marge ficam sabendo que a cidade que oferta o melhor ensino público dos Estados Unidos é a cidade de Waverly Hills (qualquer semelhança com a verdadeira Beverly Hills não é mera coincidência). Os Simpsons decidem contornar esse problema de um jeito bem peculiar e coerente com as presepadas da família: Homer procura o mais barato apartamento que seu dinheiro pode alugar em Waverly Hills (um verdadeiro muquifo de um cômodo e sem banheiro), só para ter um endereço no distrito e assim conseguir que Bart e Lisa estudarem lá.

Esse é exatamente o assunto da tese que defendi no último mês de Julho. Em Belo Horizonte, o sistema de cadastro escolar adota um critério de proximidade para a sugestão das matrículas dos alunos. O problema disso é que as melhores escolas de BH se situam nas áreas mais próximas dos bairros de maior renda (os bairros Waverly Hills de BH). Fazendo um paralelo com o episódio do Simpsons mencionado, imagine um pai chamado Romero, que mora no Jardim Canadá, e decide alugar uma pequena kitinete no Santo Agostinho para o filho estudar na EE Pandiá Calógeras, uma das melhores estaduais de BH.

Uma parte engraçada do episódio é que Waverly Hills possui um fiscal para saber se os pais realmente moram lá e não estão tentando burlar o sistema. Por conta disso, Homer tem de realmente morar no apartamento alugado até que receba a visita do fiscal. Veja como o sistema que antes era gratuito se torna caro: a família precisa alugar para ter um ensino melhor (está de certa forma "pagando" pelo ensino) e o sistema público precisa de fato conferir se as pessoas moram em Waverly Hills, um custo privado e um público, dois ônus advindos de lacunas do sistema.

Assista aqui o episódio para ver o que acontece no final. Em Belo Horizonte não sei se alguma família mantém um endereço fantasma para conseguir vaga em uma melhor escola pública, provável que não. O que existe é tentar conseguir endereços de familiares, amigos, e do trabalho. Convenhamos que a solução do Homer é cara demais considerando que no Brasil escolas particulares são mais comuns e algumas mais acessíveis do que escolas particulares nos EUA. Uma possível solução abordada na tese é tentar fazer com que o sistema se aproxime da real preferência dos pais, ao mesmo tempo em que se tenta deixar o sistema público de educação mais homogêneo.

Liberalismo na teoria e na prática: sobre o golpe no centro de Difusão do Comunismo

Neste último sábado (17/08/13) o Jornal Estado de Minas publicou uma reportagem intitulada "Golpe no curso de Comunismo" em que relata liminar do juiz José Carlos do Vale Madeira da 5ª Vara de Justiça Federal. A liminar suspende as atividades do Centro de Difusão do Comunismo (CDC), um curso de extensão da Universidade Federal de Ouro Preto. Lá mesmo no prédio do ICSA - Instituto de Ciências Sociais Aplicadas - onde trabalho, há diversos cartazes de divulgação das atividades do CDC. A liminar suspende as atividades até o final do julgamento da ação popular proposta pelo advogado Leonel Pinto de Carvalho, isso é o que diz o Jornal EM.

Não sei qual será o resultado da ação contra a União nesse quesito, porém, por mais que eu acredite que o comunismo é uma área do conhecimento fora do contexto e que deveria estar legada ao conhecimento ligado à história e aos museus (sem nenhum demérito para as duas áreas, gosto de história e de museus), acho errado essa liminar de suspender o funcionamento dessa atividade de extensão e rogo para que o CDC continue ativo. 

Segundo relata o jornal, o argumento da ação popular é de que o poder público "não pode disponibilizar bens públicos para a difusão de doutrinas político-partidárias por mais relevantes que sejam historicamente". Mas aí cabe uma sutil questão: quanto do comunismo é doutrinamento e posicionamento político e quanto é pertencente ao campo do saber científico?! Por mais ideológico que eu acredite ser o comunismo, acho que não pode se privar a população de conhecê-lo. E quem melhor do que a universidade e os acadêmicos para difundi-lo? Trata-se de um curso de extensão e os interessados em conhecer a ideologia do comunismo, e até um pouco de ciência que tal doutrina possa ter, podem se cadastrar livremente para conhecer essa história, não há compulsoriedade. Não acho que o comunismo esteja ligado necessariamente a qualquer partido, embora haja os partidos intrinsecamente ligados a essa ideologia: PCdoB, PCB, PCO, PSOL, e 'N' outros no Brasil.

Como economista me questiono muito isso: sinceramente não sei o quanto dos ensinamentos de economia em sala de aula são isentos de qualquer ideologia ou doutrina político-partidária. Como economista dito neoclássico tendo a crer que a maior parte do que passo para os alunos é ciência, ou mais proximamente, um simulacro disso. É o mais próximo que os economistas conseguem chegar do referencial científico da hipótese falseável. Porém reconheço que alguns dos axiomas basilares de economia não são puramente ciência, são proposições que até o momento são úteis, são premissas e, por isso mesmo, longe de serem refutáveis. 

Se levarmos o argumento do juiz, ou da ação, ao limite de suas consequências, não poderíamos ensinar grande parte da economia nos cursos, pois por mais que tentemos lidar com isso e apresentar uma visão isenta, não acho que economia é totalmente isso. Outros cursos não poderiam sequer se ministrados e a difusão de saberes estaria limitadíssima. Pensando pelo outro lado, se essa ação vale para o CDC, poderia valer muito bem para um Centro de Difusão da Economia Austríaca, ou um Centro de Difusão do Liberalismo, por exemplo. Sem falar que a autonomia universitária foi de fato ferida como argumentaram professores ligados ao CDC. Um liberal de verdade não pode apoiar o fechamento por decreto jurídico do Centro de Difusão do Comunismo, pois isso é cercear liberdades primárias dos indivíduos escolherem aquilo que querem estudar e conhecer melhor, e cercear a liberdade da universidade ofertar livremente seus cursos. Sobre isso fico com aquela famosa máxima atribuída ao liberal-iluminista francês Voltaire: "Posso não concordar com nenhuma das palavras que tu dizes, mas defenderei até a morte o direito de dizê-las".

P.S.: Com certeza esse não é o melhor blog de economista da blogosfera, dado que de um economista marginal, mas provavelmente é o melhor blog de economista-desenhista, dado que eu mesmo ilustro alguns dos posts, :-).

terça-feira, 13 de agosto de 2013

Volta às atividades e uma opinião sobre as passagens de ônibus

Voltando às atividades do blog após longo período de hibernação devido a tese, volto aqui a postar os assuntos que mais me chamam a atenção em economia e demografia. Como alguns que acompanham esta página já sabem, isso nem sempre está diretamente relacionado ao noticiário em pauta na maioria dos jornais, mas sim em assuntos que me despertam interesse. Um dos novos posts que prometo comentar mais em breve é o assunto da minha tese, já dei alguns aperitivos sobre isso aqui no blog, mas agora terei a chance de aprofundar um pouco mais sobre o assunto. Ocorreu tudo bem na defesa, acho que posso dizer que foi um sucesso e agora a próxima etapa é trabalhar na divulgação através de artigos científicos relacionados ao assunto.

Enquanto esse post não fica pronto, coloco aqui um comentário que fiz sobre as tarifas do transporte público, comentário que fiz a pedido do aluno do curso de jornalismo da UFOP, Filipe Monteiro, para o jornal do curso:

"As manifestações populares que ocorreram no último mês de junho chamaram atenção para uma série de problemas estruturais econômicos que assolam o país. 

Atendo-se somente à questão das tarifas para o transporte público (que são preços regulados), pode-se ver três problemas importantes: o primeiro diz respeito ao despreparo no levantamento dos reais custos passageiro por KM, quando solicitada a explicar o patamar dos preços que justificava a base de custos das tarifas, a prefeitura de BH e seus órgãos competentes não conseguiu encontrar a planilha de custos que embasava os preços das passagens, ou seja, esse preço se retroalimentava e lá atrás, em algum momento, alguém fez uma planilha de custos e aquele preço inicialmente (não muito diferente de um “chute”) foi se retroalimentando por meio de uma correção ajustada pela inflação passada em uma reunião coordenada entre prefeitura e empresários da viação metropolitana. Um “chute” inicial de preços não seria problema se o mercado de linhas de ônibus funcionasse por concorrência, mas como ele é (e deve ser) regulado esse valor de base para as tarifas é muito importante. 

O segundo problema é que mesmo que por meio de concessões é possível estimular mais concorrência, a população deveria se ater mais aos mecanismos de controle no loteamento de concessões do que aos preço da passagem em si, a forma como as concessões são feitas e arranjadas entre prefeitura e empresas importa bastante. 

Por último, o terceiro problema, é que em relação aos assuntos econômicos, a população precisa às vezes aprender a refrear os ânimos, nem sempre a solução mais imediata é a melhor. Mesmo que aquele valor da tarifa inicial tenha sido um “chute”, é possível que ele tenha sido algo aproximado e não muito distante do verdadeiro custo passageiro por KM (um chute na trave, digamos), desse modo, ao abaixar os preços hoje, a sociedade só está transferindo o problema para amanhã, pois muitas empresas julgam a rentabilidade que já tinham como um direito adquirido, os contratos existem, e as prefeituras, como compensação, irão transferir subsídios maiores para o setor responsável pelo transporte público, de alguma forma a sociedade continuará pagando por aquele contrato que estava vigente. E o que é pior, pagará de forma indireta, não verá o dinheiro sair do seu bolso, e muitos que nem usam o serviço (vão à pé ou de bicicleta, por exemplo) pagarão pelo subsídio daqueles que usam. 

Isso é um arranjo econômico ruim, e por isso é preciso vigiar melhor as condições em que se dão esses contratos para dessa forma garantir o preço que a sociedade considera justo".